São Nicolau e o Krampus

Nikolausfest em Treze Tílias, Santa Catarina (foto: Marcos Spies / CCDL).

Nem todos sabem, mas o verdadeiro nome do Papai Noel é Nicolau, de Sankt Nikolaus (St. Klaus). A tradição tirolesa que recorda São Nicolau e os Krampus faz uma mescla de antigas tradições pagãs e cristãs, sendo preservada também no Brasil.

A origem do Papai Noel é a figura de São Nicolau: a roupa de sacerdote se tornou uma roupa de inverno, a mitra de bispo que se tornou um gorro e a longa barba branca que indica a sabedoria. Nem todos sabem, mas o “bom velhinho” que traz presentes é uma tradição que chegou ao Brasil na década de 1920 e se popularizou nas décadas de 1930 e 1940. A mensagem da caridade e da fé em Deus deu nome ao Papai Noel, que quer dizer “Papai do Natal”.

A festa litúrgica de São Nicolau é o dia 6 de dezembro. Na Idade Média, era comum presentear pessoas neste dia, recordando as boas ações do sacerdote católico. O costume se alastrou por boa parte da Europa Central, onde se comemorava o dia do santo com pessoas que se “fantasiavam” de São Nicolau, usando vestes episcopais e entregando doces ou pequenos presentes às crianças. Nos países germânicos é chamado Nikolaus, em inglês Santa Claus, onde Claus (“Klaus”) é um diminutivo de Nikolaus). No Tirol Italiano é chamado San Nicolò ou San Nicolau.

Nikolausfest (Festa de São Nicolau) em Treze Tílias.

No Tirol e demais regiões dos Alpes São Nicolau não chega sozinho. Com ele vêm também seu ajudante, o Knecht Ruprecht, um anjo, simbolizando a santidade e os Krampus, criaturas que têm sua origem nas antigas mitologias grega e latina e representam a punição para o mau comportamento. Há também a figura da bruxa, resquício da antiga tradição celta nos Alpes. A bruxa chega varrendo e “limpa” as impurezas do ano que se vai, preparando a chegada do novo ano.

Krampus é uma antiga palavra germânica para “garras”, cujas origens estão nas tradições da Antiguidade, quando os Romanos festejavam no dia 5 de dezembro as Lupercalias, festa originária na Grécia.

Mosaico romano representando Fauno.

 Na festividade romana, os sacerdotes imitavam Fauno Luperco, um ser mitológico meio bode e meio homem (entre os gregos, com aspectos de lobo também), guardião das florestas, dos campos e colheitas, patrono da festa da Lupercália.

Os sacerdotes sacrificavam bodes e se vestiam com suas peles ensanguentadas. Com uma vareta, batiam no rosto dos jovens que deveriam passar por tal provação assustadora sorrindo, pois acreditavam se tratar do próprio Fauno. Tratava-se de um rito de passagem para a fase adulta.

Fauno. Museu Nacional do Palazzo Massimo alle Terme, Itália.

Com o tempo, os romanos que se convertiam ao Cristianismo abandonavam suas antigas crenças que eram consideradas “demoníacas”. No entanto, o costume de se fantasiar com chifres e peles de bode se manteve na região alpina no período do solstício de inverno. Foi assim que as tradições de se vestir como São Nicolau e como Fauno se uniram, dando origem à figura do Krampus.

Grupo da festa de São Nicolau em Treze Tílias, Santa Catarina (Foto: Marcos Spies / CCDL).

Inicialmente, a Igreja tentou acabar com os faunos, mas o costume se mantinha e, não podendo acabar com ele, preferiu dar um caráter diabólico ao fauno, que passou a simbolizar o mal que pune aqueles que não praticaram boas ações durante o ano. A origem do atual nome talvez esteja na antiga palavra germânica Krampus, com significado de “animal com garras”; em dialeto bávaro, Kramps significa “sem vida”, “murcho”, “que não vive”, e sua simbologia poderia muito bem representar um ser diabólico, privado da Vida Eterna cristã.

O Krampus é aquele que “castiga” as crianças desobedientes com golpes de vara ou prendendo-as com correntes, enquanto as boas crianças recebem os presentes do Nikolaus. Em algumas regiões do Tirol e Baviera, o santo chega também com Rupert (um “velho” ajudante com barba negra) e seus anjos (geralmente crianças fantasiadas, que trazem o cesto de presentes).

É costume no Tirol que aquele que interpreta S. Nicolau faça perguntas às crianças sobre seu comportamento, peça para recitar a tabuada ou que demonstrem saber as orações do Pai Nosso e Ave Maria.

Uma antiga trova em dialeto trentino (tirolés), ainda mantida por descendentes da Colônia Tirolesa de Piracicaba, retrata São Nicolau e sua importância para os “escolares”, ou seja, para as crianças que estudam e o aguardam todos os anos, na esperança de ganharem seus presentes: San Nicolau da Bari, l’èi festa de scölari, scölari no i völ far festa, San Nicolau ghe da en testa! [São Nicolau de Bari, é festa dos estudantes, estudantes não querem fazer festa, São Nicolau lhes bate na cabeça!]

San Nicolau e la Bèstia (São Nicolau e o Krampus) na Coônia Tirolesa de Piracicaba. São Paulo.

Em Treze Tílias, SC, a tradição da festa de São Nicolau é preservada há 90 anos pelos descendentes de imigrantes. Na Colônia Tirolesa de Piracicaba, SP, a tradição recorda um outro nome para o Krampus, em dialeto trentino: a Bèstia (“animal”).

São Nicolau e os Krampus em Treze Tílias, Santa Catarina.

Uma tradição muito similar é mantida na cidade catarinense de Guabiruba, no Vale do Itajaí, fundada por alemães oriundos de Baden. Os personagens típicos da tradição local são os Pelznickel, que em muito lembram os Krampus.

Pelznickel em Guabiruba, Santa Catarina.

Presente principalmente nos países germânicos, no Tirol Italiano (região de Trento), a chegada de São Nicolau “compete” com a de Santa Luzia, figura mais mais popular no Norte da Itália e Suécia, tradição preservada em Nova Trento, Santa Catarina.

Santa Luzia com o burrinho (Valsugana, Tirol Italiano).
Santa Luzia em Nova Trento, Santa Catarina.

Para mais tradições tirolesas do período natalino, clique aqui.

Deixe um comentário