12 de abril de 1809

Tirol Panorama Bergisel
Tirol Panorama – Museum Bergisel, Innsbruck.

O Blog Tiroleses no Brasil recorda um episódio muito simbólico no Tirol, que culminou com a vitória dos rebeldes tiroleses em uma batalha ocorrida na montanha Isel (al. Bergisel; it. Monte Isel), nas imediações de Innsbruck.

Prof. Dr. Misael Dalbosco (Nova Trento, SC)

Em 12 de abril de 1809, os tiroleses iniciavam “oficialmente” sua luta contra Napoleão Bonaparte. Os meses conturbados que se seguiram envolveram toda a região do Tirol.

Já nas primeiras tentativas de ocupação francesa no Tirol, os atiradores voluntários (al. Schützen; it. Bersaglieri, Sìzzeri) combateram contra o exército invasor nos vales e  montanhas do Tirol meridional. Com a chegada das tropas bávaras e a queda do governo austríaco, o Reino da Baviera (naquele tempo não existia a Alemanha como país) quis incorporar o Tirol e a nova administração procurou alistar os tiroleses no exército bávaro, sem grande sucesso. Em diversos vales formaram-se grupos de resistência, considerados criminosos pela administração napoleônica e, por isso, muitos rebeldes foram perseguidos. Animados por sentimento patriótico, as milícias de rebeldes tiroleses passaram a se organizar e contaram, inclusive, com algum auxílio financeiro e militar da administração austríaca.

AH_luta_01Os rebeldes não concordavam com a invasão de seu amado Tirol pelas tropas bávaras e francesas – e muito menos com as proibições de caráter religioso impostas por um governo “iluminado”. O anticlericalismo bávaro causou grande desconforto na população do Tirol. Para os tiroleses, a revolta simbolizava uma “guerra santa”, na qual o inimigo não era somente mais uma ameaça estrangeira, mas assumia uma representação diabólica, contrária às leis da ordem natural e da moral cristã.

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Detalhe da pintura na capela dedicada a Hofer no Vale Passíria.

Entretanto, faltava aos tiroleses um líder que pudesse representar em si os anseios da população. Contrariando as conveniências da época, tal líder não era membro de nenhuma família da nobreza local, mas o dono de de uma taberna localizada na pequena cidade de São Leonardo (al. Sankt Leonhardt in Passeiertal; it. San Leonardo nella Val Passiria), próxima à cidade de Merano. Figura carismática e singular pela grande estatura e pela longa barba negra, Andreas Nikolaus Hofer (1767 – 1810), era pai de família e fervoroso católico. Não é por menos que o levante popular teve seu início “oficial” com um ato religioso ocorrido no dia 12 de abril de 1809, ministrado pelo padre capuchinho Joachim Haspiger, considerado um dos líderes da insurreição tirolesa.

Hofer Bandeira do Tirol

Após uma missa com bênção da bandeira tirolesa (cujas cores verde e branca indicavam também o culto ao Sagrado Coração de Jesus), as companhias de atiradores voluntários haviam se organizado em praticamente todos os vales tiroleses e tinham na pessoa de Andreas Hofer seu “chefe supremo”. As milícias eram apoiadas por alguns membros clero e auxiliadas por setores da nobreza austríaca, com destaque para o príncipe e arquiduque João de Habsburgo (1782 – 1859), irmão do imperador Francisco I. Boa parte dos atiradores que combateram em Bergisel era composta por tiroleses italianos, principalmente do vale de Fieme (it. Val di Fiemme; al. Fleimstal). Hofer falava perfeitamente o italiano (e o dialeto trentino) e lhes dava as ordens em seu idioma. Hofer era conhecido por General Barbon entre os tiroleses italianos.

Il Generale barbon nel ritratto di Domenico Zeni
“Il General Barbon”. Domenico Zeni.

No dia 24 de abril de 1809 ocorreu uma batalha em Volano (al. Nussdorf), no Vale Lagarina (it. Vallagarina, al. Lagertal), na qual Andreas Hofer esteve presente. Após a resistência tirolesa na cidade de Mori (al. Moor), as tropas francesas foram expulsas do Tirol Italiano e Hofer seguiu para a cidade de Arco (al. Arch), próxima ao Lago de Garda (al. Gardasee, Gartensee). Entre abril e maio de 1809, os rebeldes tiroleses venceram várias batalhas locais, intimidando o exército franco-bávaro. O príncipe bispo de Trento, Pietro Virgilio Thun, havia fugido para o exílio, mas a cidade de Trento estava liberta e, com a vitória alcançada em Bergisel no dia 29 de maio de 1809, os tiroleses retomaram o controle regional, expulsando as tropas napoleônicas e instaurando um governo provisório que durou quase dois anos.

Heimkehrender_Tiroler_Landsturm
Heimkehr (“retorno para o lar”), Franz von Defregger.

AH_3000_ducados_EhrenketteÀ frente do novo governo estava o próprio Andreas Hofer, que não tinha interesses políticos diretos, haja vista que esperava poder ver o fim da guerra para poder reintegrar o Tirol no Império Austríaco. A união popular para resistir ao perigo estrangeiro reforçou profundamente o sentimento de unificação política e administrativa da região tirolesa. O vitorioso líder tirolês espalhou sua fama pela Europa ao desafiar Napoleão e demonstrar que o general corso não era, de fato, “invencível”. E quem o demosntrava era um homem simples, taberneiro conhecido pela longa barba negra e pela coragem e religiosidade. O capitàn barbón (“capitão barbudo”), como era conhecido entre os tiroleses de língua italiana, tornou-se célebre e sua popularidade lhe garantiu o reconhecimento da nobreza austríaca e da Igreja, que condecorou Andreas Hofer com um colar de honra (al. Ehrenkette) de três mil ducados.

AH_lutaNapoleão mantinha forte influência no governo de Viena e obrigou o imperador austríaco a ceder definitivamente o governo do Tirol ao Reino da Baviera. O receio e o conformismo da nobreza, com sua política ambígua que não apoiava oficialmente os tiroleses nem afrontava diretamente Napoleão, não interveio no Tirol com medo de represálias e foi corresponsável pelo enfraquecimento da insurreição popular. Após algumas batalhas contra as tropas bávaras (que procuravam continuamente recuperar o poder em Innsbruck), o governo provisório de Hofer estava enfraquecido, politicamente isolado e seu líder debilitado.

Com o avanço das tropas napoleônicas vindas da França, Baviera e Itália, Andreas Hofer se refugiou em sua terra natal. Várias cidades tirolesas sofriam com a fome e com represálias. A derrota final culminou com a traição de um dos ex-combatentes tiroleses, Josef Raffl, chamado posteriormente “o Judas do Tirol”, que entregou Hofer em troca de uma quantia em dinheiro. O líder da revolta foi capturado no refúgio de montanha da família, localizado na terra natal. Preso, seguiu para Arco, no Tirol Italiano e, dali, foi levado para Mântua, onde ouviu sua sentença ao fuzilamento (com ordem direta de Napoleão), ocorrido em 22 de fevereiro de 1810. Os demais líderes da revolta, como padre Joachin Haspinger, fugiram para não terem o mesmo fim trágico de Hofer.

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